domingo, 16 de dezembro de 2012

Corinthians, o mundo é seu

Diz a bandeira que já tremulou diante de mim: Corinthians, o meu mundo é você. Agora, a frase sofre justa metamorfose. Corinthians, o mundo agora é seu.

E para que a redenção acontecesse, muito se padeceu. A suprema humilhação do rebaixamento me lembra outro triste momento. No mesmo dia, eu perdia o emprego.

Ainda naqueles brabos dias, o presidente dizia aos rivais. Riam enquanto podem. É a última vez.

Aconteceu.

De passo em passo o colosso se reergueu. Serviu de moldura para um Fenômeno, reentrou à Libertadores e nela tropeçou. Da segunda vez, como nenhum outro. Interrompeu a trajetória ajoelhado diante de um certo Tolima. Antes da chave de grupos.

Riam enquanto podem, incautos.

Tão criticada, a diretoria apostou alto contra a voz da maioria e acertou. Tite fica, e comanda mais uma campanha vitoriosa: a do quinto título brasileiro.

A taça veio num 4 de dezembro cheio de triste simbologia. Doutor Sócrates, o Magrão, acabara de partir. Não sem antes cruzar de leve pela minha existência. Alguns meses antes, na palestra sobre a democracia, lá estava ele, gigante na forma e no conteúdo.

Os grilhões que insistiam em não nos libertar estavam prestes a ceder. Já calejado e repleto de raro controle emocional, uma equipe sem brilho de estrelas mais uma vez tinha pela frente um sempre bravo Vasco da Gama. O mais difícil dos oponentes nos encontrava nas quartas-de-final. 

Num passo em falso, Alessandro por pouco não se vê ruir. Diego Souza avança e, no mais improvável dos lances, é derrotado por Cássio, recém empossado goleiro titular. Aos 42, Paulinho faz o tento que enfim derruba o Gigante da Colina.

Um rival direto aparece em seguida. O Santos de Neymar embalou uma rivalidade pontuada por alguns exageros. Mas o ótimo menino da Vila não foi suficiente diante de um adversário mais consistente.

Uma epopeia não se faria grandiosa se no confronto final não houvesse o poderoso Boca Juniors. Embora combalido, trazia nas costas uma camisa cuja história já vitimara Palmeiras, Santos e Grêmio. Naquele ano, fizera o Fluminense de grande elenco retornar às Laranjeiras de mãos abanando.

No duelo de La Bombonera, um certo Romarinho parecia alheio a tanta pressão e abriu o caminho ali mesmo. Em solo paulistano, a República Popular recebeu as bênçãos de um Sheik.

Ficou pequeno o tal continente

O mundo era o limite. Na partida, a equipe recebeu a mais comovente das despedidas. Cerca de quinze mil torcedores desejaram boa sorte. Outra multidão descoloriu o Oriente. A terra do sol refletia preto e branco. E os fiéis pareceram guiar o seu onze com a costumeira maestria. 

Que ninguém se enganasse. Ainda que se apontasse sorte por não se bater de frente com um quase imbatível Barcelona, o Chelsea merece extremo respeito. Mais rico e de elenco mais vistoso, o time inglês era franco favorito. O Corinthians fez  valer a condição de gigante e brigou em pé de igualdade.

Tamanha atuação alinhou uma certa mística. O embate acontecia exatos 22 anos depois da conquista do primeiro Brasileiro. O raiar dos vinte e tantos minutos do segundo tempo misturou ao momento dois tentos sofridamente redentores. Zé Maria cobra a falta, a defesa afasta, Fabinho pega a sobra e avança. A defesa afasta, e Wadimir cabeceia na testa de Oscar. A bola sobe e um certo peruano balança as redes. Não à toa, o rapaz resumia no nome a essência dos 102 anos desta história: Guerrero!

O oponente azul não desistiria. Apupou até o último segundo! E sucumbiu à última trave. 

Feliz, a Fiel de novo fez da Paulista o seu palco. Usou as saídas do metrô para tremular suas bandeiras. Entoaram cantos e gritos. Tinha até uma bela moça com a camisa do Peru. Olhou pra mim e disse: "É nóis! Guerrero!" 

Diz a bandeira que já tremulou diante de mim: Corinthians, o meu mundo é você. Agora, a frase sofre justa metamorfose. Corinthians, o mundo agora é seu.